Literatura de IA

O movimento fez com que a oferta de conteúdo aumentasse ainda mais do que já temos em nosso dia a dia.  

O simples correr de olhos pelas prateleiras de uma livraria já costuma ser suficiente para nos convencer de que há mais livros no mundo do que jamais conseguiremos ler. Para os amantes da leitura, esse sentimento é frequentemente acompanhando pela ansiedade de se selecionar um bom título o quão logo possível, para que nenhum tempo de leitura – escasso que é – seja desperdiçado. 

Creio que parte do nosso fascínio com os livros advenha da incrível possibilidade que eles nos oferecem de entrarmos em contato com as grandes mentes que já andaram nesta terra – reconhecidas como tais pela estima com que suas obras foram preservadas – ao longo de inúmeras gerações.  

De filósofos, como Agostinho de Hipona, a romancistas, como Machado de Assis, a físicos, como Isaac Newton; personalidades ímpares ao longo da história expuseram seus pensamentos, expressaram sua criatividade, fizeram seus questionamentos por meio da linguagem escrita. Lê-los é ter acesso, hoje, à forma como enxergavam o mundo.  

Mas a que podemos esperar ter acesso ao ler um livro produzido por uma inteligência artificial?  

Cada vez mais se tem ouvido falar sobre inteligências artificiais hoje em dia, mas ainda resta muita confusão sobre o que elas são e o que elas não são. O CEO da empresa OpenAI, criadora da ferramenta ChatGPT, em entrevista à emissora ABCNews (OpenAI CEO, CTO on risks and how AI will reshape society), no início do ano disse o seguinte:

É muito tentador [para as pessoas] antropomorfizar o ChatGPT, mas acho que é importante falar sobre o que ele não é, tanto quanto o que ele é. Porque está tão arraigado em nossa formação biológica o ímpeto de responder a alguém falando conosco, você fala com o ChatGPT – o que, na verdade, é você falando com esse “transformer”, em uma nuvem, e ele tentando prever a próxima palavra e te responder de volta –, e você pensa que é uma entidade senciente, um ser, com quem eu estou falando e que ele vai ter sua vontade própria e vai fazer o que desejar e fazer planos com outros seres […]

(tradução nossa)

Compreendendo o ChatGPT pelo que ele é – um modelo de linguagem humana, um programa que busca emular a forma como nós, humanos, nos comunicamos em uma língua natural, com base em inúmeros exemplos de interações verbais apresentadas a ele –, é fácil perceber que ele não é capaz de ofertar aquilo que almejamos na leitura de grandes obras.

Enquanto o objetivo dos grandes textos produzidos pelo homem ao longo de toda a História é, em última instância, a investigação da alma humana e da realidade ao seu redor, o objetivo de uma ferramenta de linguagem é a linguagem em si; é se assemelhar à forma de linguagem que nos é própria.

E, veja, o nível de perícia com que essas inteligências artificiais têm conseguido emular a forma como um ser humano escreve não é de se menosprezar. Muito pelo contrário, ferramentas assim têm se mostrado de grande valor em aplicações específicas, e a tendencia é que encontremos mais e mais formas de utilizá-las a nosso favor.

Mas, quanto à qualidade da literatura produzida por uma IA, deixo o próprio ChatGPT responder:

“A literatura gerada por inteligências artificiais, como eu, é fascinante do ponto de vista da criatividade algorítmica. Ela representa uma combinação de padrões linguísticos aprendidos durante o treinamento. No entanto, a verdadeira profundidade emocional, subjetividade e experiência humana muitas vezes não podem ser completamente capturadas por algoritmos. A apreciação da literatura vai além da técnica e envolve conexões humanas e interpretações únicas. Como ferramenta de apoio criativo ou gerador de ideias, posso oferecer contribuições interessantes, mas a autenticidade humana na criação literária permanece incomparável.” (resposta à pergunta “O que você acha de literatura escrita por uma inteligência artificial como você?”).